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A Cachoeira Boca da Onça, a maior de Mato Grosso do Sul, com 156 metros de altura, está desmoronando. A rocha que dá nome ao ponto turístico perdeu a forma conhecida: a cara de um felino. Especialistas acompanham o processo há pelo menos dois anos. Imagens comparativas mostram a mudança na paisagem.
A queda d"água fica na Serra da Bodoquena, em uma propriedade privada. Segundo especialistas, o desabamento é atribuído a dois fatores:
O gerente da fazenda Boca da Onça, Luís Henrique Soares de Melo, explicou que a falta d"água é causada principalmente pela estiagem. "As nascentes formam o córrego que percorre mais de 10 km dentro da fazenda. Pela característica do solo poroso, a água da chuva cai, mas não é suficiente para chegar até a cachoeira", disse.
Mesmo com a escassez de água, o local continua recebendo visitantes e busca alternativas para manter os passeios. Em julho, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul abriu um inquérito civil para investigar intervenções na região da Serra da Bodoquena.
Paredão em formato de onça é formado por rochas esponjosas
A Cachoeira Boca da Onça é patrimônio natural de Mato Grosso do Sul e um dos principais atrativos da Serra da Bodoquena. A queda d"água faz parte do complexo do cânion do rio Salobra e está na zona de amortecimento do Parque Nacional da Serra da Bodoquena.
O professor da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em geologia, Paulo César Boggiani, explica que as rochas da região são calcárias e precisam de água para se manter firmes. A Boca da Onça é uma grande formação destes tipos de rochas de tufas calcárias, que podem se desmanchar sem a presença de água.
Ele detalha que as tufas crescem com a ajuda de microrganismos, principalmente cianobactérias, que vivem na água e se alojam em troncos caídos. "Em um padrão normal, essas tufas têm tendência a crescer porque o carbonato de cálcio se deposita ao redor do tronco durante a fotossíntese feita pelas cianobactérias", disse.
Segundo o professor, os musgos que crescem nos troncos com contato com a água servem de base para que as cianobactérias façam a fotossíntese. Nesse processo, o gás carbônico é retirado da água, e o carbonato de cálcio se deposita ao redor do tronco. Com o tempo, isso forma a tufa calcária e permite que ela continue crescendo.
Falta de chuva, seca, mudanças climáticas e desmatamento
A cachoeira enfrenta falta de água desde outubro deste ano, embora o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) indique quase 200 milímetros de chuva no mesmo período na região.
?? A seca já afetou a Boca da Onça em anos anteriores:
O biólogo da Fundação Neotrópica do Brasil, Guilherme Dalponti, afirma que o aumento temporário da água dura apenas dois ou três dias após a chuva. A escassez de água pode comprometer as rochas e afetar a fauna local, como insetos aquáticos e a libélula ameaçada de extinção Elga newtosantosi.
"Todo curso d"água tem fauna associada, principalmente insetos que dependem do fluxo constante de água. Eles alimentam peixes, anfíbios, aves e outros insetos", explica Dalponti.
Dados do MapBiomas mostram que a Serra da Bodoquena, que inclui Bonito, Bodoquena e Jardim, teve 17,3 mil hectares desmatados entre 2020 e 2024, o equivalente a cerca de 17 mil campos de futebol. Bonito registrou o maior desmatamento no período:
Segundo Dalponti, o desmatamento e a crise climática são os principais fatores que reduzem o fluxo de água. "O desmatamento vem avançando sobre as outras áreas, as áreas que ainda legalmente podem ser desmatadas [na Serra da Bodoquena]. Isso altera o fluxo hídrico, principalmente, da água subterrânea, porque a floresta permite que a água se infiltre no lençol freático, sendo o que vai manter o fluxo da água nos meses de seca", finaliza.